Achei por bem publicar esta excelente reflexão de José Eduardo Moniz!
Escrevo estas reflexões poucas horas depois de se conhecer a decisão do Governo de entregar o BPN ao BIC, por 40 milhões de euros. É um desfecho altamente penalizador para os contribuintes portugueses que tiveram de suportar, até agora, 2,4 mil milhões de euros com a instituição que Oliveira e Costa conduziu para o buraco. E, pelos vistos, mais 550 milhões, pelo menos, ainda irão ser investidos pelo Estado para garantir a recapitalização do banco.
O BPN é um bom exemplo do que não pode acontecer. Não vale a pena chorar sobre leite derramado, mas é imperioso que se aprenda com os erros. O que aconteceu, nesse caso, em matéria de regulação, não deve nunca repetir-se. Ao Banco de Portugal exige-se que seja inflexível na supervisão da actividade das instituições financeiras e que não se distraia na observação dos números e das práticas de banqueiros e gestores.
Carlos Costa tem revelado pulso firme na condução da sua actividade à frente do banco central e é bom que assim se conserve, independentemente dos protestos e queixumes dos responsáveis e protagonistas do sistema bancário. O País precisa de um regulador que não se deixe impressionar nem comover, que diga o que pensa com frontalidade e que não abdique de dar orientações ao mercado.
A economia portuguesa necessita de um sistema financeiro estável e sólido, que esteja em condições de a apoiar de maneira saudável e sustentada. A alienação de activos que o Governador do Banco de Portugal tanto tem recomendado aos bancos como forma de se recapitalizarem assenta em raciocínios lógicos e realistas perante a verdadeira dimensão dos problemas que enfrentam. É evidente que se o Estado pagasse o que deve seria meio caminho andado, pois a dívida global é astronómica, superior mesmo, na sua totalidade, aos recursos que a banca nacional se viu forçada a ir buscar ao Banco Central Europeu. Não resolveria, no entanto, a questão de fundo que é ter um dispositivo bancário exigente que se concentre no essencial da sua actividade e não se mostre permeável a negócios de sustentabilidade duvidosa, muitos deles de natureza puramente especulativa.
Para dar um futuro a Portugal é fundamental que haja coragem para começar a desfazer equívocos, entre eles, o que permitiu que se criasse a ilusão de que o País dispunha de uma verdadeira classe empresarial activa e autónoma, com capacidade para correr riscos. Sabe-se que, com poucas excepções, os grupos económicos que se constituíram, desde as empresas de construção aos conglomerados financeiros, se habituaram a viver à sombra do Estado, sujeitando-se a jogos de influências e de dependências que retiraram verdade e força às suas actividades e fragilizaram as suas estruturas accionistas, tanto do ponto de vista de independência, como de competitividade e de produtividade. As reformas que este Governo anuncia querer empreender, por pressão do acordo com a União Europeia e o FMI e, espera-se, por vontade própria, revelam-se fundamentais para que o País possa entrar nos eixos. Até agora, exímia a aplicar medidas de austeridade, a equipa de Passos Coelho terá, a curto prazo, de explicar como tenciona dar a volta a Portugal, fazendo-o crescer. Sabe-se que o reequilíbrio das contas públicas se assume como pressuposto básico para a reintrodução de racionalidade, mas os sucessivos apertos de cinto de nada valerão se não se enveredar rapidamente por políticas que conduzam ao crescimento económico.
É com desenvolvimento que o País pode atingir patamares que garantam uma economia competitiva e criar empregos com durabilidade e consistência. O resto não passa de palavras sem recheio e que o vento leva como penas de pássaro. Sem iniciativa privada dinâmica, criativa e com capacidade de arriscar dificilmente se sairá da situação actual. A revisão das funções do Estado e o seu afastamento de muitas empresas, tanto em termos de propriedade como de gestão, poderão dar um contributo importante à mudança. Nem tudo é mau na presença estatal na economia, mas abundam os exemplos que apontam em sentido contrário. A privatização de actividades e entidades na órbita do Estado, se executada com transparência e com base nas melhores soluções e propostas, será eventualmente um passo nesse percurso. Do mesmo modo, a extinção de organismos oficiais que só servem para dar emprego a ‘boys' partidários e consumir recursos de todos nós representa princípio elementar de racionalidade, além de constituir um desejável princípio de justiça. Não há, pois, tempo a perder.
Os dias passam e os portugueses querem começar a ver uma luz ao fundo do túnel em que entraram e de onde têm dificuldade em vislumbrar como dele conseguirão sair. O primeiro-ministro reúne ainda um capital de esperança que permite que, por enquanto, os portugueses lhe concedam o benefício da dúvida. Precisa, porém, demonstrar ser capaz de cumprir as promessas eleitorais e retirar Portugal da condenação ao empobrecimento inevitável. Para tanto, não pode permitir erros como o das nomeações para a Caixa Geral de Depósitos, péssimas para a imagem e credibilidade do Governo, por tudo o que implicam. Sobretudo, numa altura em que muita gente sofre, que muitos empregos desaparecem e que o custo de vida se agrava. A suspeita de que há filhos e enteados, que se actua de uma forma para o povo e de outra para o grande capital, não traz bons sinais.
José Eduardo Moniz
Jornalista
E acrescento, quem fala assim, não é gago!
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