segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Não mais BPN (reflexão de José Eduardo Moniz)

Achei por bem publicar esta excelente reflexão de José Eduardo Moniz!

 Escrevo estas reflexões poucas horas depois de se conhecer a decisão do Governo de entregar o BPN ao BIC, por 40 milhões de euros. É um desfecho altamente penalizador para os contribuintes portugueses que tiveram de suportar, até agora, 2,4 mil milhões de euros com a instituição que Oliveira e Costa conduziu para o buraco. E, pelos vistos, mais 550 milhões, pelo menos, ainda irão ser investidos pelo Estado para garantir a recapitalização do banco.

 O BPN é um bom exemplo do que não pode acontecer. Não vale a pena chorar sobre leite derramado, mas é imperioso que se aprenda com os erros. O que aconteceu, nesse caso, em matéria de regulação, não deve nunca repetir-se. Ao Banco de Portugal exige-se que seja inflexível na supervisão da actividade das instituições financeiras e que não se distraia na observação dos números e das práticas de banqueiros e gestores.
 
 Carlos Costa tem revelado pulso firme na condução da sua actividade à frente do banco central e é bom que assim se conserve, independentemente dos protestos e queixumes dos responsáveis e protagonistas do sistema bancário. O País precisa de um regulador que não se deixe impressionar nem comover, que diga o que pensa com frontalidade e que não abdique de dar orientações ao mercado.

A economia portuguesa necessita de um sistema financeiro estável e sólido, que esteja em condições de a apoiar de maneira saudável e sustentada. A alienação de activos que o Governador do Banco de Portugal tanto tem recomendado aos bancos como forma de se recapitalizarem assenta em raciocínios lógicos e realistas perante a verdadeira dimensão dos problemas que enfrentam. É evidente que se o Estado pagasse o que deve seria meio caminho andado, pois a dívida global é astronómica, superior mesmo, na sua totalidade, aos recursos que a banca nacional se viu forçada a ir buscar ao Banco Central Europeu. Não resolveria, no entanto, a questão de fundo que é ter um dispositivo bancário exigente que se concentre no essencial da sua actividade e não se mostre permeável a negócios de sustentabilidade duvidosa, muitos deles de natureza puramente especulativa.

 Para dar um futuro a Portugal é fundamental que haja coragem para começar a desfazer equívocos, entre eles, o que permitiu que se criasse a ilusão de que o País dispunha de uma verdadeira classe empresarial activa e autónoma, com capacidade para correr riscos. Sabe-se que, com poucas excepções, os grupos económicos que se constituíram, desde as empresas de construção aos conglomerados financeiros, se habituaram a viver à sombra do Estado, sujeitando-se a jogos de influências e de dependências que retiraram verdade e força às suas actividades e fragilizaram as suas estruturas accionistas, tanto do ponto de vista de independência, como de competitividade e de produtividade. As reformas que este Governo anuncia querer empreender, por pressão do acordo com a União Europeia e o FMI e, espera-se, por vontade própria, revelam-se fundamentais para que o País possa entrar nos eixos. Até agora, exímia a aplicar medidas de austeridade, a equipa de Passos Coelho terá, a curto prazo, de explicar como tenciona dar a volta a Portugal, fazendo-o crescer. Sabe-se que o reequilíbrio das contas públicas se assume como pressuposto básico para a reintrodução de racionalidade, mas os sucessivos apertos de cinto de nada valerão se não se enveredar rapidamente por políticas que conduzam ao crescimento económico.

 É com desenvolvimento que o País pode atingir patamares que garantam uma economia competitiva e criar empregos com durabilidade e consistência. O resto não passa de palavras sem recheio e que o vento leva como penas de pássaro. Sem iniciativa privada dinâmica, criativa e com capacidade de arriscar dificilmente se sairá da situação actual. A revisão das funções do Estado e o seu afastamento de muitas empresas, tanto em termos de propriedade como de gestão, poderão dar um contributo importante à mudança. Nem tudo é mau na presença estatal na economia, mas abundam os exemplos que apontam em sentido contrário. A privatização de actividades e entidades na órbita do Estado, se executada com transparência e com base nas melhores soluções e propostas, será eventualmente um passo nesse percurso. Do mesmo modo, a extinção de organismos oficiais que só servem para dar emprego a ‘boys' partidários e consumir recursos de todos nós representa princípio elementar de racionalidade, além de constituir um desejável princípio de justiça. Não há, pois, tempo a perder.

 Os dias passam e os portugueses querem começar a ver uma luz ao fundo do túnel em que entraram e de onde têm dificuldade em vislumbrar como dele conseguirão sair. O primeiro-ministro reúne ainda um capital de esperança que permite que, por enquanto, os portugueses lhe concedam o benefício da dúvida. Precisa, porém, demonstrar ser capaz de cumprir as promessas eleitorais e retirar Portugal da condenação ao empobrecimento inevitável. Para tanto, não pode permitir erros como o das nomeações para a Caixa Geral de Depósitos, péssimas para a imagem e credibilidade do Governo, por tudo o que implicam. Sobretudo, numa altura em que muita gente sofre, que muitos empregos desaparecem e que o custo de vida se agrava. A suspeita de que há filhos e enteados, que se actua de uma forma para o povo e de outra para o grande capital, não traz bons sinais.

José Eduardo Moniz
Jornalista


E acrescento, quem fala assim, não é gago!

Sem comentários:

Enviar um comentário